Comissão especial do Senado que analisa o projeto do novo Código de Processo Penal – PLS 156/09 –, aprovou a criação do juiz de garantias. A medida, que deve ir a plenário na terça-feira, enfraquece os poderes de magistrados que atuam nas varas federais especializadas em delitos financeiros, evasão de divisas e lavagem de dinheiro – crimes que são alvo das operações espetaculares da Polícia Federal.
O juiz de garantias é um sistema que separa atribuições e responsabilidades. O magistrado de primeiro grau que decretar prisões temporárias ou preventivas, autorizar interceptações telefônicas e ordenar buscas e apreensões não mais poderá presidir a ação penal e julgar os alvos daquela apuração policial por ele deflagrada. O julgamento ficará sob responsabilidade de outro juiz, destinatário dos autos por distribuição.
O modelo já é utilizado pela Justiça estadual de São Paulo. Nunca, porém, foi aplicado na Justiça Federal, a quem se submete a PF, instituição que tem a missão de conduzir inquéritos sobre corrupção, fraudes e outros crimes contra a União.
Juízes federais criticam a iniciativa. Avaliam que o juiz de garantias os inibe e representa "retrocesso injustificado". Eles chamam a atenção para levantamento do Conselho Nacional de Justiça: cerca de 40% das comarcas no Brasil só têm um magistrado, o que inviabiliza o juiz de garantias para todo o País. Já na avaliação de advogados, criminalistas e juristas o juiz de garantias pode acabar com supostos abusos. Eles sustentam que alguns magistrados federais agem com parcialidade porque exercem dois papéis: dirigem as investigações e, depois, julgam os investigados.
A emenda 17, aprovada pela comissão especial do Senado, tem o senador Renato Casagrande (PSB-ES) como relator e estabelece que ao juiz de garantias caberá o controle da legalidade da ação da polícia e a preservação dos direitos do investigado. Hoje, em geral, o mesmo juiz que trabalha na fase de investigação é o que dá a sentença em primeira instância.
A justificativa para criação do juiz de garantias é assegurar a imparcialidade, facilitando identificação de eventuais abusos na etapa de investigação. E ajuda a evitar que o magistrado assuma convicções prévias. A emenda proíbe que sejam declarados impedidos de presidir as ações penais os juízes de comarcas ou seções judiciárias que tenham apenas um magistrado. O veto ao impedimento valerá enquanto não for aprovada uma lei de organização judiciária que disponha sobre criação de cargos ou formas de substituição.
"A proposta não traz qualquer vantagem visível, trará dificuldades práticas severas, é baseada em argumentos questionáveis, e, por melhores que sejam as intenções dos parlamentares, parece ser dirigida ao enfraquecimento dos poderes dos juízes de primeira instância", reagiu o juiz Sérgio Fernando Moro, titular da 2.ª Vara Federal Criminal de Curitiba, que cuida de ações sobre crimes financeiros. Moro é categórico: "Dizer que a imparcialidade fica comprometida pela atuação do juiz na fase de investigação é falácia, pois o juiz não investiga, apenas autoriza medidas de investigação mais incisivas ou prisões, o que também pode fazer o juiz na fase da ação penal e, neste caso, o projeto não o considera impedido. Com tantos problemas no processo penal, como as ações que nunca terminam em decorrência dos inúmeros recursos propiciados pela legislação, causa estranheza que a principal proposta do novo código seja o juiz de garantias."
"A criação do juiz de garantias representará verdadeiro retrocesso injustificado no País", afirma o juiz Fausto Martin De Sanctis. "Quando um juiz faz o controle judicial das medidas cautelares solicitadas, como buscas, prisões e interceptações, não significa, absolutamente, comprometimento de sua imparcialidade. As sentenças absolutórias têm sido prolatadas também nestes casos, o que faz cair por terra a justificativa."
"A proposta é salutar, desde que também o juiz de garantias preserve a imparcialidade", adverte o criminalista Sérgio Rosenthal. "Medidas cautelares como buscas e interceptações estão banalizadas. São medidas graves que devem ser reservadas a casos extremos, institutos que devem ser utilizados com parcimônia e devidamente justificados. Inadmissível que toda operação de grande porte da polícia tenha como modus operandi esse tipo de medida."
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